CARTEIRA DE SENHORA
DIA 59
Não estou minimamente
habilitada, como já referi em crónica anterior, mas atrevo-me a um pequeno
parágrafo sobre o novo Papa para lhe dar as boas-vindas. Ser sul-americano, jesuíta
e escolher como nome Francisco, parecem bons auspícios. Que consiga levar a
cabo a sua missão com a humildade que demonstrou é o que todos desejamos.
O assunto desta
semana está nos antípodas do parágrafo anterior, mas a teimosia é
característica da carteira. Andava a tentar fugir-lhe mas parece inevitável. Sendo
bastante discreta, ao contrário da sua proprietária, a carteira não se
inscreveu em nenhuma rede social. Contudo, tem-se mostrado curiosa e está
interessada em saber pormenores. Satisfaço-lhe a curiosidade.
O comportamento das pessoas
dentro e fora dessas redes, a sua importância comercial, política e até social,
os grupos de infindáveis objectivos, tornam o abordar deste tema uma tarefa tão
complexa que nem sei por onde começar. Pode dar pano para as mangas de uma
série de crónicas, nunca seguidas porque já é tema gasto e cansa. Por ora ficam
apenas uns rabiscos.
O Facebook é, naturalmente, uma réplica da
sociedade real mas com alguns cambiantes porque afinal é num mundo virtual.
Calculo que já se escrevam teses de mestrado quiçá de doutoramento sobre o
assunto. Na Faculdade tive uma cadeira de Psicologia Social e outra de
Sociologia mas na altura nem computadores havia e de qualquer forma já não me
lembro do conteúdo. Na senda do que tenho vindo a fazer, limito-me a mostrar um
olhar atrevido. O meu.
A sociedade virtual,
principalmente o Facebook, como
qualquer outra situação de relacionamento humano, tem altos e baixos, vícios e
virtudes. Não há dúvida que o entrar numa rede social cibernauta significa
expor-se na praça pública, mas enquanto uns espalham uns tantos familiares na
dita praça, outros metem lá meio mundo e o outro meio. É verdade que a
exposição depende do que se diz e para quem se diz. Recados amargos para o
namorado que podem ser lidos pelo primeiro-ministro não sei se será muito
adequado mas garanto que não é nada inédito.
Em geral as pessoas agem
e interagem no Facebook de acordo com
a personalidade que lhes conhecemos, mas as surpresas abundam.
Há tímidos que
desabrocham. Surpreendem-nos algumas pessoas quando escrevem. Nem dávamos por
elas na vida real. A distância do olhar e da escrita dá asas e atrevimento.
Os expansivos, esses,
não mudam. Ocupam naturalmente o lugar que já é seu na outra vida e, autênticos
ímanes, atraem legiões de fãs. Aliás é junto deles que às vezes descobrimos os
até aí tímidos. Os expansivos têm o dom de lhes abrir caminhos.
Há também violentos
que se pacificam. É que o acto de escrever ajuda a relativizar. Funciona como a
técnica do contar até dez que toda a gente conhece mas ninguém pratica antes de
abrir a boca. Tirando os que desatam logo aos palavrões (quem sabe se não serão
uns pacíficos, afinal?) acabam por acalmar enquanto escrevem.
Claro que algumas
pessoas, por manifesta incapacidade ou por opção, praticamente não escrevem. Resguardam-se.
Limitam-se a partilhar fotografias e textos de outros. Mas se não são casos
patológicos acabam por revelar parte do seu ser.
Há depois os discretos,
tão discretos, tão mudos, que às vezes só sabemos que lêem o que se escreve
quando os encontramos na rua. Aí confessam. No Facebook não.
Também pululam perfis
falsos, servindo vários propósitos, de criminosos a polícias até pessoas
bloqueadas por outras que assim renascem das cinzas.
Há ainda e sempre os
que não estão interessados. Ou por alergia a qualquer espécie de tecnologia, ou
por fobia à exposição, ou por princípio. Começo a achar que têm razão. Não
deixa de ser fascinante esse universo, mas o tempo é precioso.
Leonor Martins de Carvalho
<< Home