CARTEIRA DE SENHORA
DIA 40
Como a carteira ainda
anda a meditar na próxima fábula, que prevejo esteja pronta lá para a quadringentésima
trigésima quinta crónica, achou por bem que esta, a quase redonda quadragésima,
pudesse espelhar o que vai na alma de muitos e ao mesmo tempo a despertasse.
Uma amiga grega
perguntou-me como é que estávamos. Disse-lhe que, como eles, éramos resistentes,
que haveríamos de sobreviver. Nós e eles.
A verdade é que se
não nos deixam sair, a nós e a eles, deste poço sem fundo, se persistem em
atar-nos com cabos de aço, e ainda se aproveitam da situação económica para, em
chantagem de baixo nível, brincarem ainda mais com os países e suas soberanias invocando
falsamente que é o caminho da salvação, as certezas tremem.
Entretanto, nunca o
provérbio “paga o justo pelo pecador” foi tão intensamente aplicado como em
Portugal e provavelmente também na Grécia.
E quem foram os
pecadores? Todos, como ainda insistem em afirmar? Vista por uma pessoa comum a
história é simples e aponta o dedo a vários.
Em primeiro lugar a
classe política que nos meteu na Europa e no euro a trouxe-mouxe sem ligar a
soberania, tradições e mesmo à economia, colaborou na destruição sem apelo nem
agravo da produção nacional, pudesse ou não vir a ser competitiva e depois
gastou à tripa-forra naquilo a que chamaram investimentos em prol do
desenvolvimento mas que foi mais desenvolvimento de bolsos e carreiras
profissionais.
Em segundo lugar
alguns dos que receberam fundos europeus apenas para os esbanjar e cuja
ganância os qualifica.
Em terceiro, mais uns
tantos que, na ilusão vendida todos os dias pelos bancos e por esta sociedade,
se endividaram até “mais do que permitia a força humana”…
Sei que os reformados
não foram com certeza, e estão a arcar como se fossem os culpados.
Mesmo quando ainda
poucos viam que a dívida até ia nua e por maioria de razão hoje ainda mais, trataram
de nos vender e escravizar, comem-nos a carne e os ossos e agora querem acabar
connosco de vez.
Algures deve estar um
cartaz onde os sucessivos governos escreveram “Portugal em saldo”. A leiloeira
começou as licitações. Teremos (já vamos tendo!) um país retalhado, pertença de
outros.
Não estou a escrever
nada de novo. Este é o género de textos que aparece diariamente. A revolta, o
sentimento de impotência já se estendeu a Portugal inteiro, e só lemos
desabafos, gritos, angústia, revolta, uma verdadeira catarse nacional.
Ou continuamos com a
angústia e revolta permanente ou vamos à lide e pegamos o touro. Em nome dos
que já nem forças têm…
Independentemente do
que possamos fazer no campo social é sobretudo na política e na forma de fazer
política que temos de arranjar solução. Para que isto não volte a acontecer.
Façam o favor de pensar.
Pensar no que podem fazer para que algo mude em Portugal. Que cada um procure o
que achar mais útil para que essa mudança aconteça. Se não se sentem
representados lutem para que isso se altere. Pode ser por exemplo encontrar
pessoas idóneas que se possam candidatar nas autárquicas contra os oligarcas do
costume, assinar e divulgar petições que pugnem por mudanças na lei eleitoral, organizar
e participar em debates, escrever para e nos jornais, comentar nos meios de
comunicação, voltar a falar com vizinhos e amigos para criar e participar em
grupos que possam servir de pressão, seja o que for, mas sair de casa.
Sobretudo largar a Internet, a televisão, deixar a casa quente e ir para o
terreno.
Chegou a hora de
voltarmos a ser heróis que “por obras valerosas se vão da lei da morte
libertando”. Que de nós se orgulhem os vindouros.
Leonor Martins de
Carvalho
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