quinta-feira, 15 de abril de 2010

ENTREVISTA

A pedido de vários amigos, volto a publicar a entrevista que concedi, no dia 27 de Fevereiro de 2009, ao Manuel Azinhal, autor do saudoso blogue O Sexo dos Anjos. E, se a republico, aqui e agora, é porque voltaria hoje a responder, a tudo, da mesma maneira. Ei-la:
1 - "Eternas Saudades do Futuro" é um projecto assumidamente individual. O que o levou a optar por esse modelo?
- O Eternas Saudades do Futuro é, de facto, um blogue pessoal — pessoalíssimo, até. Não resulta da razão, mas, sim, do coração, isto é, o que lá publico ocorre-me intuitivamente. Portanto, não se pode falar em opção. Porém, acredito que o que nos sai automaticamente é resultado da cultura que transportamos connosco: a que vem do berço, e a que adquirimos nas voltas da vida, com as respectivas opções estéticas e éticas, fruto dos mestres que nos ensinaram a ver, compreender e escolher.
2 - Gosta de se sentir um "redresseur des torts"?
- Não sei se estou à altura de tão nobre tarefa, correspondente a tal epíteto. Certo, certinho, é que nasci na época errada e tento viajar no tempo — afinal, temos 900 anos de História por explorar, com heróis, sábios e santos — procurando energia nas lições do passado para me projectar num renovado futuro. Sinto-me um vanguardista nas formas e um tradicionalista nos valores; contudo, procuro ainda a coerência que advirá da síntese desses dois vectores. Na arte e na vida.
3 - Quais as razões para que seja tão curto o tempo médio de vida dos blogues?
- Os portugueses têm muita dificuldade em acabar aquilo que começam. Também não lidam bem com a pontualidade. São, ainda, preguiçosos. Detesto todas essas características, que me fazem, aliás, assumir cada vez mais uma atitude misantrópica perante a gente que me rodeia e ter nos livros os melhores amigos. É ridículo observar que há blogues muito bem escritos mas totalmente vazios de ideias e vice-versa. Aproveito esta divagação, em tom de desabafo, para dizer que um blogue tem de ser sustentado por autenticidade e cultura. Estas duas características escasseiam, igualmente, hoje.
4 - Depois destes anos todos a observar a blogosfera, o que lhe parece que esta trouxe de novo à batalha das ideias e da informação?
- Perante o espanto e a admiração geral, a blogosfera portuguesa veio mostrar que há pessoas, desalinhadas com o pensamento único ditado pelo politicamente correcto, que pensam pela sua própria cabeça e que não se conformam com a ditadura cultural consentida por um sistema que há muito entregou aos intelectuais de esquerda a hegemonia cultural. O sistema trata da economia e dá de mão-beijada as artes e as letras a esses intelectuais. Uns e outros, ficam todos contentinhos com o acordo.
5 - O que espera ainda da blogosfera?
- Tudo. Pois só aqui Portugal poderá recuperar as tradicionais liberdades (que não a fictícia Liberdade) que nos foram legadas por D. Afonso Henriques e seus cavaleiros e que se têm vindo a perder irreversivelmente de há 200 anos para cá. Ena pá!, o que eu fui dizer...
6 - A forma mais eficaz de fazer política passa por dizer que não se faz?
- Não sei, eu não faço política...
7 - Comente as seguintes afirmações:
a) Só pode progredir o que permanece.
- Sem dúvida. Resistir é vencer, e vencer corporiza-se na belíssima imagem de um homem de pé entre as ruínas. O futuro é feito do que permanece depois de evaporada a espuma dos dias. Esse caudal que avança — de geração em geração —, unido por um invisível fio-condutor, é a Tradição. É por aí que vou.
b) Bloguismo rima com narcisismo.
- Já se sabe que bloguismo rima com diarismo; no entanto, importante é ter consciência que bloguismo rima com activismo: os blogues são as catacumbas do nosso tempo.
c) A internet abriu o caminho a um gramscismo tecnológico.
- Percebo pouco disso... Mas, a despropósito, apetece-me dizer, para rematar, que só haverá mudança de paradigma político se existir um ambiente cultural propício. Este, terá de ser necessariamente enformado por uma nova estética. Para mal dos nossos pecados, a esquerda percebeu isso no século XVIII. Reedificar a comunidade nacional orgânica, assente em valores tradicionais, que tem vindo a ser destruída desde aí, será tarefa só possível através da argamassa cultural fabricada na internet.